A necessidade de criar sistemas e
organismos de defesa comunitários contra imponderáveis de natureza física ou
social nasceu, certamente, com as próprias sociedades humanas e foi-se tornando
mais estruturada à medida que a complexidade das mesmas avançava. Assim, é de
supor que já no neolítico existissem mecanismos empíricos de proteção contra
catástrofes naturais que tivessem em conta não apenas a defesa individual mas
também a proteção dos bens da comunidade.
O que ao certo sabemos é que, por
exemplo, os antigos egípcios, criadores de uma sociedade estruturada
hierarquicamente de forma bastante complexa, desenvolveram o que chamaríamos
hoje de “sistemas de proteção civil” destinados a proteger as populações contra
as inundações do Nilo, aproveitando as mesmas para fertilização dos terrenos 1*,
enquanto que, na Roma antiga, no ano de 27 a.C., terá surgido o primeiro corpo de
bombeiros, então designado por “vigiles”, que tinham como missão patrulhar « as ruas para impedir incêndios e «policiar a cidade» 2*.
No ano de
872, em Oxford, Inglaterra, foi criado, pela primeira vez, um toque de alerta
para incêndios, marcando a obrigatoriedade de todos colaborarem na sua
extinção, tendo, mais tarde, esta norma sido estendida a todo o território por
Guilherme, o conquistador.
Na sequência
do grande incêndio que devastou a cidade de Londres em 1666, «as companhias de
seguro da cidade começaram a formar brigadas particulares para proteger a
propriedade de seus clientes» 3*, e, em 1679, «em Boston, depois de
um incêndio devastador que destruiu 155 edifícios e um certo número de barcos,
«houve a fundação do primeiro Departamento Profissional Municipal Contra
Incêndios na América do Norte» 4*.
No século
XVIII, em Massachusetts, já existiam «sistemas de defesa contra o fogo, tais
como, exigências que em cada casa houvesse disponível cinco latas (tipo balde).
Em caso de incêndio era dado alarme
através dos sinos das Igrejas e os moradores de cada casa passavam então a organizarem-se
em grandes filas, desde o manancial mais próximo até o sinistro, passando as
latas de mão em mão» 5*.
A primeira
«organização profissional de bombeiros terá sido criada em 1853, em Cinccinati,
Ohio, utilizando «bombas a vapor em veículos tracionados por cavalos 6*.
Em Portugal,
na década de 30 do século passado, registou-se um grande impulso criador de «corpos de bombeiros nas comunidades
locais, « tendo por base os conselhos. Em 1930 «existiam 150 corpos dos quais
129 eram constituídos por voluntários e 21 por elementos municipais
profissionais, sapadores e não sapadores« 7*. Por essa altura,
surgiu a “Liga dos Bombeiros Portugueses”, e, dez anos mais tarde, «criaram-se
associações de bombeiros em que os seus elementos não limitavam a sua ação a
extinguir incêndios, também socorriam feridos, doentes, náufragos, bem como
levavam a sua atuação a outras formas desinteressadas de socorrer vidas humanas
e bens» 8*.
Em Mora, os bombeiros chegaram nos primórdios da
década de quarenta do século passado, graças à ação de um punhado de
beneméritos, de entre os quais se destacou o seu primeiro comandante – Manuel
José Godinho. Depois de ter iniciado a sua carreira de “aspirante de finanças”
em Aljesur, concorreu ao mesmo cargo em Mora, tendo sido colocado na repartição
local de finanças em 1938. Sobre ele escreveu Lopes Correia: «Foi nos meados de 1939 que lhe
levedou no íntimo a ideia de fundar uma corporação de bombeiros e quando ela
definitivamente se lhe cristalizou na alma pôs nisso um querer tão obstinado
que não houve muros de indiferença, de críticas, de sorrisos escarninhos e até
de vivos obstáculos que não tentasse derrubar. E derrubou. Nos primeiros dias
de Janeiro de 1940, com a indispensável bênção das autoridades, aspergida com
hissope e caldeirinha, os bombeiros foram uma realidade» 9*.
Graças ao
livro de memórias publicado por Virgínia F. Falcão, podemos ler a ata fundadora
da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Mora, que aqui, por
curiosidade, se transcreve:
«Aos nove dias do mês de Janeiro de
1940, reuniram-se numa sala do 1.º andar do prédio onde se encontra instalada a
Farmácia Falcão desta Vila de Mora, os Srs. António Pinheiro Falcão, João
Pereira Branco, Manuel José Godinho e eu, José Ventura, e, todos irmanados no
mesmo sentimento de poderem ser úteis à Humanidade, resolveram constituir-se em
Comissão Organizadora dum Corpo de Salvação Pública na Vila de Mora.
Depois disto, começaram por trocar
impressões sobre diversos assuntos que interessam ao início da Corporação.
Assim, começaram por elaborar uma
lista de indivíduos que haviam de convidar para futuros Bombeiros.
Nesta escolha teve-se em muita
atenção a integridade de carácter e moral dos indivíduos escolhidos, pois a
Comissão só procura ter no seu seio indivíduos com uma moral compatível com os
fins, verdadeiramente altruístas, das associações como esta, que se propõem
criar.
Na escolha dos indivíduos a que
acima se faz referência, foi a Comissão muito e valiosamente auxiliada pelo Sr.
Luís Ferreira de Figueiredo.
Deliberou-se em seguida mandar
imprimir 500 circulares, que serão mandadas distribuir pela população da Vila e
nas quais se roga aos habitantes de Mora a inscrição como sócios da humanitária
Associação.
Mais resolveram e assim consideram
fundada no dia de hoje a ”Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de
Mora”, que ficará por agora dirigida pela referida Comissão até se tornar
possível a existência legal da mesma.
Não havendo mais nada a tratar,
encerrou-se a sessão, lavrando-se de tudo, para os devidos efeitos, a presente
acta, que vai ser assinada por todos e por mim, José Ventura, servindo de
secretário, que a escrevi.
(Assinam: António Pinheiro Falcão,
João Pereira Branco, Manuel José Godinho, José Ventura)» 10*.
Prof. Joaquim Lagartixa
2 vd. http://www.bombeiros-bm.rs.gov.br/hist-mun.html
3 Idem.
4 Ibidem.
5 Ibidem.
6 Ibidem.
7 Vítor Luís Eleutério, (1999), “Bombeiros”, in António Barreto & Maria Filomena Mónica (coords.), Dicionário de História de Portugal, Porto, Liv.ª Figueirinhas, suplemento A/E, vol. VII, p. 187/8.
8 Idem.
9. Lopes Correia, “memorial de uma vila”, ediliber, edição póstuma, Coimbra, 1994, p.37.
10 Virgínia F. Falcão, “A Farmácia, a Praça e a Vila”, Edições: Rui F. Falcão, dezembro de 2000, pp. 27-28.
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