terça-feira, 22 de outubro de 2013

MORA, ANTES E AGORA (?)



Há alguns meses atrás, num dia de Primavera, que este ano foi magnífica, fui buscar ao expresso da tarde, que vinha de Lisboa, um amigo que convidei para vir cá conhecer a terra. Ao desembarcar – e depois de ter relanceado os olhos em volta – exclamou: “ah, Mora, mas é bonito!”
Surpreendeu-o a amenidade do vale da ribeira em frente, o leve ondular das colinas para lá do leito do rio, o odor das flores das laranjeiras esparsas pela encosta do casario da vila e o jogo da malha. “aqui ainda se joga à malha”, exclamou admirado….
Sim, jogava-se à malha no largo, havia um não sei o quê de acariciador no ar ameno, nas mesas da esplanada ao lado algumas pessoas conversavam tranquilas olhando os passageiros que desembarcavam – e o comentário do meu amigo fez-me pensar na razão pela qual nós, que cá vivemos, nem sequer damos por isto! Estamos demasiado preocupados com as tarefas do dia-a-dia, em ler as mensagens que nos chegam aos écrans dos telemóveis, computadores e tabletes, muitas vezes chegadas do outro lado do mundo, e nem sequer sabemos olhar para o que nos rodeia; e o pior, acreditem, é que isto nos empobrece dramaticamente!
Lopes Correia não era assim; os tempos também eram diferentes. Lopes Correia gostava de Mora e soube dizê-lo sem complexos. Nem sequer era da terra, era de Trancoso, mas escreveu sobre Mora de uma maneira admirável. Deixou-nos um livro, infelizmente muito pouco conhecido intitulado “Memorial de Uma Vila”, onde nos conta, em crónicas despretensiosas, episódios saborosos da vida quotidiana de meados do século passado, da terra que foi, para ele, lugar de eleição e de adoção.
Sabia olhar para a Vila, como ninguém: esse «borrifo de cal derramado encosta abaixo» e comprazia-se a olhar as ruas, os becos e as pequenas praças da malha urbana que então tinha uma superfície bem menor do que a atual.
«Se nunca reparaste nisto, se nunca deambulaste no silêncio da noite, por estes recantos cheios de mistério; se nunca pousaste os olhos, quando galgas a veia da ribeira onde tufos de salgueiros bebem água no veio da corrente, nesse borrifo de cal derramado encosta abaixo, e é a mais saborosa vista da vila, então permite eu te diga que nunca olhaste a tua terra com a ternura de filho» - escreve na página 41 do livro acima citado, numa edição póstuma de autor publicada pela Ediliber em Coimbra no ano de 1994.
Com estas linhas pretendemos iniciar um conjunto de pequenos artigos que falem, de forma despretensiosa, sobre as obras de um punhado de autores que escreveram sobre Mora e o seu concelho; autores que nos contam histórias engraçadas sobre o passado da região, abordando personagens e episódios da vida das pessoas que viveram antes de nós no espaço que hoje habitamos.

Vista panorâmica de Mora (fotografia Prof. Manuel Pinto)
Prof. Joaquim Lagartixa

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